29.2.08

código da privacidade


"(…) No antigo mundo rural, por força da difícil mobilidade e da pequena dimensão dos aglomerados, as pessoas conheciam-se todas umas às outras, sabiam tudo uns sobre os outros: a necessidade de privacidade, de reserva da vida privada, não encontrava aí lugar. As pessoas estavam em condições de avaliar da exactidão das informações que circulavam: mais cedo ou mais tarde, se fosse caso disso, a verdade seria apurada e restabelecida. Foi a facilidade dos transportes e a formação de grandes aglomerados urbanos que trouxeram consigo o sentimento da necessidade de respeito pela vida privada, problema que se foi tornando mais presente na exacta medida em que as grandes cidades foram crescendo: as pessoas deixaram de saber quem são uns e quem são outros. (…) [A]s inovações na forma de comunicar (…) vieram a emprestar premência ao desejo de privacidade, na medida em que a informação sobre a vida das pessoas tinha encontrado um veículo privilegiado para a sua rápida e extensiva difusão: a comunicação social. (…) [P]assou a ser fácil destruir a reputação de uma pessoa ou lançar na praça pública os pormenores mais íntimos da sua vida privada. Foi preciso chegarmos a 1948 para que, pela primeira vez, um instrumento jurídico, ainda que não vinculativo, consagrasse o direito ao respeito pela vida privada: a Declaração Universal dos Direitos do Homem. (…) O primeiro instrumento jurídico vinculativo veio a surgir (…) em (…) 1950, [na] Convenção Europeia dos Direitos do Homem, que no nº1 do seu artigo 8º afirma que “toda a pessoa tem direito ao respeito da sua vida privada e familiar, do seu domicílio e da sua correspondência”. (…) [C]om o desenvolvimento e difusão das tecnologias da informação, com particular relevo para as grandes bases de dados pessoais (…), para a Internet e para a vigilância electrónica. Esta última é, em nome da segurança. Efectuada tanto por câmaras de vídeo como por detectores de som, tanto por sensores de consumo de fluidos no interior dos lares – água, electricidade ou gás – como pela conservação e intercepção de comunicações, ou ainda até pela localização de pessoas ou veículos, através do GPS (Global Positioning System). (…) A nossa Constituição, a Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, as directivas comunitárias e variada legislação avulsa (…), bem se esforçam por confirmar a protecção da privacidade e dos dados pessoais como um direito fundamental."

J. de Seabra Lopes (Prefácio)

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